Os
escravos fugitivos, mesmo franzinos, enfrentavam com vantagem seus
perseguidores: um negro sozinho lutava com vários brancos,
valendo-se da agilidade de uma coisa difícil de definir mistura de
manha, malícia, inteligência, reflexos condicionados. Disfarçando-a
em dança acrobática, os negros conseguiram pratica-la e
desenvolve-la diante de seus próprios senhores, que se divertiam com
as chulas dos berimbaus e das palhaçadas dos sorridentes
contendores. Proíbida durante muito tempo, a capoeira sobreviveu na
Bahia e hoje, ensinada em academias ou universidades, começa a
firmar-se como o mais fascinante dos esportes: o único genuinamente
brasileiro.
No
início não adiantava fugir. O escravo que tentasse era logo
apanhado por homens treinados especialmente para caçá-los: os
capitães-do-mato. Subnutridos e cansados, os negros não tinham
condições de medir força com aqueles homens. Os fugitivos eram
torturados até quase à morte, mas, depois de recuperados, quando
surgia a oportunidade, fugiam novamente.
Esse
amor à liberdade fez com que o negro aperfeiçoasse uma espécie de
luta e ou de dança que já praticava na África. Consistia em não
oferecer resistência aos golpes do adversário, esquivando-se
sempre, mas de modo a ficar perto para contra-atacar. A força era
secundária e o que contava era a agilidade e a malícia. Quando o
capitão-do-mato atacava, o negro tirava o corpo e deixava a mão ou
o pé: estava nascendo a capoeira.
ORIGEM
Não se
pode precisar a época em que a capoeira começou a ser praticada. A
maioria dos documentos sobre a escravidão foi queimada em praça
pública por Rui Barbosa, então Ministro do Governo Deodoro da
Fonseca, visando apagar da História do Brasil, a “mancha negra da
escravidão”. Sabe-se que os escravos bantos de Angola trouxeram
para o Brasil uma dança guerreira, ou um jogo atlético, defensivo e
agressivo. As circunstâncias obrigaram o negro a desenvolver esse
jogo, que se tornou uma das mais eficientes lutas.
Capoeira
é um mato fechado e miúdo, onde os negros fugitivos se escondiam e
aplicavam os primeiros golpes nos seus perseguidores. Também
escondidos nas capoeiras, os negros treinavam e aperfeiçoavam sua
luta. Quando capturados ensinavam nas senzalas ou nas prisões aos
outros escravos os novos golpes aprendidos quando em liberdade.
Noa
quilombos os negros já praticava a capoeira, e de uma forma bastante
evoluída. A História registra que os escravos, mesmo franzinos,
enfrentavam com vantagem os perseguidores. Um negro sozinho lutava
com vários brancos, valendo-se da agilidade e de uma coisa difícil
de definir – mistura de manha, malícia, inteligência, reflexos
condicionados.
AGILIDADE
CONTRA A FORÇA
A
capoeira deu mostra de sua força quando os primeiros
capitães-do-mato, ou do campo, passaram a voltar de suas caçadas de
mãos vazias, ou mesmo a não voltar. O negro começava a oferecer
resistência e estava desenvolvendo uma luta muito eficaz.
“Capitão
-do-campo
Veja
que o mundo virou
Foi ao
mato pegar negro
Mas o
negro lhe amarrou”
Com os
contínuos fracassos dos capitães-do-mato, a capoeira começou a
sofrer suas primeiras perseguições. A solução foi dançar
novamente. Batendo palmas quando não havia berimbaus ou atabaque, o
negro fazia marcação daquela dança acrobática e ia treinando seus
músculos e aguçando seus reflexos. Quando os guardas se aproximavam
a música tornava-se mais lenta, assim como os movimentos. Os guardas
achavam graça e deixavam os negros com suas brincadeiras
inofensivas, e a dança -luta continuava.
A
música, que em capoeira chama-se chula, não servia apenas para
disfarçar a luta: dava ritmo ao jogo, e suas letras reivindicavam a
liberdade, lamentavam os maus tratos dos feitores e narravam o
desenrolar do jogo.
E assim
que a capoeira conseguiu sobreviver à época da escravidão, com as
rodas alegres, ao som do berimbau e das palmas. O feitor achava
bonito, os negros brincando de Angola, batia palmas também e os
jogadores continuavam. Jogavam-se no chão, olhavam-se de cabeça
para baixo, riam e dançavam uma dança esquisita, de gingados e
pulos, ou rolavam no chão como cobras. Trocavam as pernas pelos
braços ou ameaçavam os companheiros com a cabeça sempre sorrindo,
brincando e inventando gestos.
JB –
15 de dezembro de 1970. Cesarion C. Praxedes
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